Ana de Lemos - Diretora-executiva de MSF-Brasil
O ano de 2020 chegou ao fim com a esperança de dias melhores, aliada à preocupação com o agravamento da crise de saúde pública no Brasil e no mundo. Infelizmente, a pandemia continua, e o país se vê mergulhado em uma segunda onda da COVID-19, ainda mais agressiva. Milhares de famílias vivem a angústia de lidar com um vírus perigoso e traiçoeiro e, lamentavelmente, muitas perderam parentes ou amigos queridos — a cada uma delas, oferecemos nossa solidariedade e nosso mais profundo pesar.
Vivemos dias difíceis, com nosso sistema de saúde constantemente à beira do colapso — ou mesmo colapsado em muitas regiões. Seguimos necessitando que o poder público reconheça a gravidade da crise e ofereça uma resposta centralizada e coordenada, alinhada com as pesquisas médicas mais recentes. É preciso manter o distanciamento e as medidas de prevenção, acelerar a vacinação, testar e rastrear contatos de infectados.
É nesse cenário que Médicos Sem Fronteiras (MSF) completa 50 anos de dedicação à humanidade: enfrentando um dos maiores desafios de toda a sua história. Em entrevista, nosso presidente internacional, Christos Christou, reforça a importância de confiarmos na ciência e de entendermos que, para estarmos seguros, é preciso que todos também estejam. Ele, que visitou nosso país no final de abril, dividiu conosco suas impressões sobre o trabalho de resposta à COVID-19 no Brasil, onde MSF completa 30 anos de atividades.
O primeiro projeto de MSF no Brasil ocorreu no início dos anos 1990, quando respondemos a epidemias de cólera e malária que atingiram comunidades indígenas no Norte do país. Depois, atuamos em projetos para comunidades nas favelas e população em situação de rua, em emergências climáticas, no atendimento a migrantes e refugiados. Ao longo de três décadas, buscamos ser uma voz importante no que se refere à ajuda humanitária e a discussões sobre a saúde no país. Hoje, temos o apoio de cerca de 600 mil doadores e, todos os anos, centenas de brasileiros estão em nossos projetos pelo mundo. Agora, estamos vivendo a parte mais intensa dessa história: desde 2020, a COVID-19 gerou uma mobilização sem precedentes de recursos e de profissionais de MSF no país. Nessa luta, já passamos por dez estados brasileiros, com enfoque maior na região Norte.
Em meio à disputa mundial por vacinas ainda produzidas em ritmo lento, o artigo de Felipe Carvalho, coordenador da Campanha de Acesso no Brasil, explica o que é o Covax e por que ele é um mecanismo tão importante na luta pela distribuição equitativa dos imunizantes.
Na seção “Direto de”, a psicóloga Andréa Chagas narra sua experiência durante as sessões de saúde mental oferecidas por MSF aos profissionais da linha de frente em Manaus, no período marcado pela traumática crise do oxigênio. E ressalta a grandiosidade dos trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS) em condições tão adversas.
O mês de abril foi o mais letal de toda a pandemia no Brasil, quando atingimos a triste marca de 400 mil vidas perdidas. O que mais nos indigna e entristece é saber que muitas dessas mortes poderiam ter sido evitadas. Precisamos de um recomeço bem–coordenado, baseado na ciência, que dê à população as condições necessárias para se recuperar e vencer a catástrofe causada pela COVID-19.
Sabemos das dificuldades impostas pela pandemia e, mais do que nunca, somos gratos por contar com seu apoio. Obrigada por continuar fazendo parte da rede de solidariedade que nos permite salvar vidas em emergências como a que estamos vivendo. Juntos, somos mais fortes e podemos ir muito mais longe.